a pigmeu colorida escreveu
uma carta para o querubim cândido de asas tortas... pois, a paixão de tango
impossibilitou o diálogo... eles falavam, mas, não diziam; ouviam-se e não se
escutavam; abraçavam-se num desabraço; indesejavam-se com desejo pulsante... só
restava a pigmeu colorida enviar-lhe uma carta... carta com som de blues
acompanhado de uma morna, as letras seriam as notas de um samba
descompassado... a folha de papel tinha gosto de castanha na rua e cheiro de ananás...
a tinta rosa da caneta era a flor que ela queria lhe ofertar em versos...era
uma carta difácil... escrita com tato, audição, paladar e olfato... cada
palavra rompia as delicadas veias do seu coração, os desenhos que a caligrafia
formava eram banhados pelas lágrimas que escorriam pelo canto do olho... ele, o
seu amor ibérico, orquestrado por uma melodia afrolatina se perdia entre as
linhas azuis do caderno... ela não sabia colocar ponto final na carta, com ele
sempre quis ponto seguinte sem reticências! não havia interrogação no seu amor
pelo querubim cândido, tudo era intensamente exclamação nas cordas imaginárias
cortadas no espaço... mergulhada num rio-mar de sensações que ela só podia
declarar ao papel a deusa saudade tomou conta de si... saudade dele e deles;
saudade do xamego de abraços na praça em noite fria; saudade dos caracóis
desgrenhados bailando em suas mãos; saudade de gostar dos mesmos gostos;
saudade do suor que exalavam ao dançar semba; saudade
do adormecer enroscado; saudade da divergência apaixonante pelo cinema; saudade
dele dentro dela e dela encima dele... a carta se transformou numa imensa
saudade densa... rasgada... escancarada... caótica... lasciva... terna... ela
sabe que escreveu aquela carta apenas para lhe dizer: EU TE AMEI!...
Violeta Serena
Lisboa, 29/10/2015
Para o Querubim Cândido
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